(Adaptado de Artur Queiroz “Direcção da UNITA e Guerra Total”)
A UNITA foi sempre dirigida de fora para dentro, desde Jonas Malheiro, que escolheu ser Savimbi que tem conotações com morte. A direcção da UNITA em 1971 era o coronel Passos Ramos, chefe da inteligência militar portuguesa na Zona Militar Leste. Este por sua vez recebia ordens do general Bettencourt Rodrigues, comandante supremo das tropas. Um oficial superior também dirigia a UNITA a partir do quartel-general da Região Militar de Angola (RMA) em Luanda. Chefiava uma repartição e recebia ordens directas do general Luz Cunha, comandante em chefe das forças armadas portuguesas em Angola.
Militantes do MPLA arriscaram a liberdade e a vida para desviar da tal repartição do quartel general da RMA cartas de Savimbi aos generais Luz Cunha e Bettencourt Rodrigues, ordens de operações conjuntas e transferência de militares da UNITA para os Flechas da PIDE em Cangamba e Gago Coutinho (Lumbala Nguimbo).
Existia uma ordem secreta para que uma companhia de artilharia, a pretexto de proteger os madeireiros entre Cangumbe e Munhango, apoiasse Jonas Savimbi até todas as suas tropas serem integradas no Exército português. A companhia do exército português que protegia Savimbi em Cangumbe era comandada pelo capitão Benjamim de Almeida que anos mais tarde escreveu um livro intitulado “O Conflito na Frente Leste”.
Em Outubro de 1973, o grande guerrilheiro e presidente da UNITA enviou-lhe uma carta com este pedido:
“Não gostaria de ser incómodo, mas é a necessidade que me obriga a solicitar a sua boa vontade, caso possa fazê-lo, para me arranjar: Uma boa capa de chuva, um par de botas altas militares número 42, cinco frascos de aero-om e algumas bisnagas de bálsamo de mentol, pomada tópica. Caso lhe seja possível adquiri-los, gostaria que me indicasse quanto é”. (Páginas 199 e 200 do livro Angola- O Conflito na Frente Leste).
O tenente Sabino fazia de correio entre Savimbi e o capitão Almeida. Em 1974, acabou o embuste porque o Movimento das Forças Armadas derrubou o regime colonialista e fascista. Savimbi arranjou logo outra direcção para a UNITA em Lisboa, Kinshasa e Pretória. Em 1978, tudo mudou de figura. A 10 de Abril foi criado o “Grupo de Contacto” constituído pelas potências ocidentais que tinham fortes interesses na África do Sul (EUA, Canadá, França, Inglaterra e Alemanha). Logo a seguir, esses países apresentaram a “Proposta de Acordo sobre a situação da Namíbia” ao secretário-geral da ONU. O compromisso era criar condições para o fim do regime de apartheid e a libertação da Namíbia. No dia 29 de Agosto de 1978, o secretário-geral Boutros-Ghali submeteu ao Conselho de Segurança da ONU um plano para a aplicação das medidas preconizadas.
Marcolino Moco sabe isto tudo, e sabe também que a direcção da UNITA passou para o “Grupo de Contacto” com o apoio de Pretória no terreno. E todo o mundo sabe que esse cartel de potências ocidentais o que queria era instalar um regime de apartheid entre o Maiombe e a Cidade do Cabo. Savimbi era apenas dava a cor.
A operação foi desmascarada quando as tropas invasoras sul-africanas retiraram do Cuando Cubango em Março de 1988 (dez anos depois do embuste chamado Grupo de Contacto) e deixaram para trás os tanques Oliphant, última maravilha da indústria bélica da República Federal da Alemanha. A Força Aérea de Pretória era constituída por aviões franceses e britânicos sendo estes construídos na própria África do Sul, como os Impala.
Na fase decisiva da guerra, o Presidente Reagan ofereceu mísseis FIM-92 Stinger ao regime racista de Pretória, via UNITA que só servia de biombo para contornar as sanções da ONU ao regime de apartheid. O Canadá despejou armas na África do Sul a granel. Esse foi o papel do Grupo de Contacto, armar o regime de apartheid e dirigir a UNITA. Savimbi fazia de chefe guerrilheiro e político sagaz!
Na fase mais aguda da Guerra pela Soberania Nacional e a Integridade Territorial entrou em cena a “Estratégia da Guerra Total” concebida pela “Afrikaner Broederbond” (Irmandade Africâner), uma rede secreta dos “boers”. Eram os ultras do regime racista. Tinham imenso poder económico e influência política em Pretória, Washington Londres, Paris e Bona (RFA). A direcção da UNITA passou a ser exercida também por esta sinistra organização.
E tu sabes, meu caro Marcolino Moco, que assim aconteceu. Foste primeiro-ministro e tiveste acesso a informação privilegiada.
A Irmandade Africâner encarou a possibilidade de bombardear com armas nucleares algumas cidades angolanas. Conhecido por “Pelindaba-South African Nuclear Corporation”, o projecto de armas nucleares estava localizado em Pelindaba, lugar onde nos anos 70 foram desenvolvidas as bombas atómicas sul-africanas. Só não tinham como transportá-las nem dispositivos para fazê-las explodir.
Marcolino Moco, quando a UNITA perdeu as eleições, a sua direcção em Lisboa e Pretória ordenou a Savimbi que regressasse à guerra. Moco sabe bem que ele era um pau mandado e nada mais que isso.
Depois de 2002, a Irmandade Africâner cobrou de Isaías Samakuva fidelidade aos acordos. Mas ele tentou cortar as amarras. Quando perdeu as eleições de 2002, a direcção da UNITA em Lisboa e Pretória decidiu mesmo afastá-lo. Atiraram para a frente com Abílio Camalata Numa. Ele foi muito desajeitado e a manobra falhou rotundamente.
Marcolino Moco sabe que a Irmandade Africâner queria a guerra total e não mais eleições.
No dia 4 de Julho de 2013, sob a alegada violação dos Estatutos pela Comissão Política e pelo Presidente do Partido, Isaías Samakuva, Abílio Kamalata Numa, apresentou à direcção interna um documento que qualificou de “Recurso de clarificação da violação dos Estatutos”. Esperava por uma vaga de fundo dos militantes que afastasse o líder que perdeu a confiança da direcção externa.
Abílio Kamalata Numa sempre foi o favorito da Irmandade Africâner. Reforçou esse favoritismo porque recompensou a direcção da UNITA na África do Sul. Numa fez o mesmo quando o chefe morreu no Lucusse. A Irmandade Afrikander recebe, vende e paga todos os lotes de diamantes, onde for preciso e na moeda mais conveniente. Mas Numa é politicamente muito desajeitado e foi derrotado.
Nas eleições de 2017, Samakuva averbou nova derrota. Lisboa e Pretória não gostaram. E decidiram radicalizar a UNITA. Colocaram Adalberto da Costa Júnior à frente do biombo, sabendo que é o mais desqualificado e desprestigiado membro da direcção interna. A missão dele é criar condições para a guerra total versão “manual do militante da UNITA”. Partir tudo, pôr em causa os órgãos de soberania, atirar com o caos e a violência para cima da democracia.
A Irmandade Afrikander é isto que quer. Aas forças de extrema-direita portuguesas que congregam os restos do colonialismo, mais os “civilizados herdeiros” de Mário Soares exigem o fim do poder do MPLA.
Marcolino Moco sabe que a partir de agora já não há lugar para disfarces. E o que faz Moco que tudo sabe? Nada. Finge e torna-se cúmplice de mais uma matança.