Estou cansado de ameaças. Dizem-me mentiroso. Têm-me como vendido.
Podem amputar-me tudo trago aos olhos de todos, sou um cidadão livre, jamais hipotequei tudo quanto pulsa no meu coração e é expelido pela voz e pela escrita. Jamais conseguirão amputar-me a alma, ninguém a vê, só eu a sinto, e nela carrego a verdade, mesmo quando dói, não há lugar, nunca houve, para uma boa mentira. 
O meu horizonte está cada vez mais curto, não seria neste caminho do fim que eu abdicaria da razão que sustenta a verdade, a minha verdade. Em cada entardecer sinto a brisa na janela a invadir a minha solidão, mas mesmo na noite mais escura há uma candeia que ilumina a saudade, e nela estão as prateleiras, algumas empoeiradas, que a memória ainda tem vida para dar vida aos factos que vivi.
Tenho quatro amores eternizados nos marcas do meu caminho, a minha querida Mãe, o meu filho, a minha neta, e Angola onde está o meu Ukuma, entre a serra da Munda e o rio Kwiva, onde naquele ocre empoeirado e nos caminhos gentios entre caniços e capim, descalço com uma arco e uma fisga, onde mora inexoravelmente um pedaço de mim.  
Hoje vou começar por uma abordagem que me arrepia de tristeza, nada tenho a ver com o MPLA, mas a hipótese do Partido e o País poder vir a ser dirigido por Higino Carneiro, que na irracionalidade que se vive em Luanda assente no ódio a João Lourenço, gera coligações improváveis em política séria, perspetiva um retrocesso ou falência de uma República Soberana livre e democrática, mas exigente e solidária.
Higino Carneiro já teve poder, muito poder: Aliou as estrelas de militar, trepou na política, foi dos marimbondos um dos que mais ruído fazia, sabia o que o enxame queria, e montou nos anos 90 uma logística de depravação que a história um dia irá contar.
Teve dois embaixadores, um fixo em Paris, Rui Legot, outro itinerante, Belo Belô. Ao primeiro comprou um apartamento na capital francesa junto à Torre Eiffel,ao segundo facultou uma suíte de luxo num hotel em Paris, e tinha para o serviço um restaurante “CHICA”, junto ao Centro Pompidou.
De Paris partiam para Luanda voos privados com Champagne, acepipes como Foie Gras e Caviar, Pata Negra, Fromage Roquefort, e caixas de vinho PETRUS, simplesmente o mais caro do mundo.
O Rui Legot tinha um cartão American Express, ilimitado.
O trabalho de Belo Belô, era ainda mais requintado, várias vezes detido pelas autoridades francesas, foi nos anos 90 o maior cliente privado da TAP, em executiva, que levava dezenas de prostitutas modelos de Paris para Luanda, algumas vezes com escala semanal em Libreville, onde Omar Bongo também alienava os seus generais com mordomias “calientes”. Belo Belô morreu envenenado, Rui Legot morreu sozinho e abandonado, apoiado num dos seus ajudantes serviçais, António Margarido, são tomense radicado em França.
Por várias vezes fui abordado pelo director da DGR em Paris, o comissário Olivier Boulanguez, que me interrogava em amenos almoços no”Beirão” e no “Estoril”, restaurantes em Paris, sobre a arrogância e prepotência de alguns políticos angolanos de então, que envergonhavam os cidadãos angolanos, esbanjando dinheiro ilimitadamente. 
Na ocasião, embaixadores de Angola em França, Boaventura Cardoso, e na UNESCO, Francisco Van Dúnem, nunca pactuaram com estes desmandos e alucinantes, era um fundamentalismo degradante que deixou rasto em França, no Mónaco, em Espanha e Portugal, onde fizeram, também, muita gente rica com a servidão e subserviência.
Pode um homem desta índole, com este passado que gerou vulnerabilidades intelectuais e fragilidade na autoridade, liderar um Partido da envergadura do MPLA, com a possibilidade de ser Presidente da República?
Creio que Higino Carneiro viveu momentos, teve um relacionamento com José Eduardo dos Santos instável por desvios e traições, tem um passado que em Angola e no estrangeiro teve contas a prestar à justiça, e mesmo em acontecimentos públicos que em nada abonam a sua integridade social.
Higino Carneiro é um cidadão que em política, teria de ser reciclado e proscrito do espectro de uma Nova República.