De acordo com o Banco Mundial, a Zona de Comércio Livre Continental Africana (ZCLCA) representa uma grande oportunidade para o continente retirar da pobreza extrema vários milhões de pessoas (30 milhões) e para aumentar os rendimentos de outros 68 milhões que vivem com menos de 5,5 USD por dia.
Com a sua aplicação, o comércio tenderá a ser mais descomplicado e menos burocrático, e irá contribuir para um conjunto de reformas profundas que são necessárias, se pretendemos crescimento exponencial dos países africanos.
Este acordo, que entrou em vigor no primeiro dia do ano após várias décadas de negociação, com avanços e recuos, começou com alguns agouros auspiciosos. Em breve, graças a um acordo fechado no âmbito do COVAX Facility, as nações africanas podem começar a receber quantias maiores das vacinas Pfizer-BioNTech e Oxford-AstraZeneca no combate à COVID-19. Ao fazê-lo, as suas economias podem avançar ainda mais em direção ao crescimento e recuperação pós-coronavírus.
Apesar da grande conquista, porém, a área de livre comércio prevista no continente africano, ainda enfrenta muitos obstáculos. O comércio intra-africano é notoriamente baixo, correspondendo a apenas cerca de 15 % do comércio total de mercadorias do continente em 2016.
Como resultado das barreiras comerciais existentes, Andrew Alli, ex-presidente e CEO da Africa Finance Corporation, salientou que não espera um verdadeiro livre comércio na África tão cedo: “Acho que vai demorar muito, infelizmente, para que essas barreiras comerciais caiam e os atritos comerciais diminuam. Mas, você precisa começar de algum lugar, e a ZCLCA fornece uma estrutura e um roteiro para que isso aconteça”.
Quais são, por conseguinte, as principais barreiras para desenvolver um “Mercado Comum Africano”? Um problema sempre premente está ligado às elites governantes, que frequentemente almejam interesses nacionais de curto prazo em busca da sobrevivência política, em vez de implementar compromissos regionais.
Outra questão fundamental, está associada ao comércio informal que continua generalizado e não é reflectido com precisão nas estatísticas oficiais. Embora os governos possam fazer pronunciamentos sobre o fechamento de fronteiras e níveis de tarifas de importação, o comércio informal não cessa. Isso reflecte uma confluência de fatores históricos e institucionais: fronteiras nacionais artificiais estabelecidas pelas autoridades coloniais e mantidas após a independência, fronteiras porosas entre as nações vizinhas, uma longa história de comércio regional anterior à era colonial, grupos de parentesco que transcendem as fronteiras nacionais, fraca capacidade de fiscalização das fronteiras , funcionários aduaneiros corruptos que lucram com o conluio dos contrabandistas e a falta de coordenação entre os países.
São estes e outros atritos de longa data que os países africanos devem resolver, tendo em vista uma cooperação económica mais eficiente. E, se tudo correr bem, deveremos lembrar, que este acordo faz parte da “União Africana 2063” – é uma visão de 50 anos para a África e é passo a passo que se vão conseguindo remover as várias barreiras comerciais, tanto no plano político, como no cultural.
Embora alguns economistas postulem que os benefícios (em termos de acesso ao mercado) que os acordos comerciais proporcionam aos países maiores poderiam ser proporcionalmente menores do que aqueles que proporcionam às economias menores ou médias, eles ainda proporcionam benefícios gerais. Como já destacámos inicialmente, o Banco Mundial confirma que a ZCLCA é uma grande oportunidade para África, tanto na vertente da pobreza extrema, como dos rendimentos das pessoas. Enquanto isso, a Comissão Económica das Nações Unidas para África (CEA), prevê que a ZCLCA aumentará o comércio intra-africano entre “15 a 25 %, ou USD 50 biliões a USD 70 biliões, até 2040.” Na verdade, a CEA argumenta que este acordo é o único caminho de África para o desenvolvimento sustentável.
A ZCLCA está ancorada em cinco protocolos globais: comércio de bens, comércio de serviços, solução de controvérsias, investimento e direitos de propriedade intelectual e política de concorrência. O objectivo do acordo é eliminar progressivamente 90% das tarifas sobre os produtos. A eliminação de barreiras não tarifárias, como procedimentos alfandegários onerosos, também são imperativos estratégicos, assim como uma melhor cooperação em matéria de normas relativas aos produtos, facilitação do comércio e medidas sanitárias. Enquanto isso, o acordo estabelece um mecanismo para a resolução de litígios, chave fundamental para garantir o seu cumprimento.
Tudo isto é óptimo na teoria. Contudo, ainda não sabemos se acabará realmente com os fechamentos arbitrários de fronteiras e os atritos comerciais que têm afectado os países africanos ao longo dos anos. Se isso acontecer, pode significar um novo florescimento económico para o continente.