Em Angola, está a emergir um fenómeno político que merece atenção urgente: o Neo-Santismo. Não se trata apenas de uma saudade mal resolvida pelo passado, mas sim de uma tentativa organizada de ressuscitar uma falsa Idade de Ouro associada ao consulado de José Eduardo dos Santos. O que está em jogo não é memória histórica — é poder, influência e, sobretudo, a manutenção de privilégios adquiridos à custa do Estado.
No centro desta manobra estão os filhos do antigo presidente (Zenú e o seu grupo Rádio Essencial/Valor Económico, Isabel dos Santos, Tchizé dos Santos), que procuram reabilitar o legado do pai não por patriotismo, mas para proteger os seus interesses económicos e blindar-se contra investigações judiciais. A aliança com sectores da UNITA liderada por Adalberto Costa Júnior (UNITA-ACJ) é estratégica: ambos os lados veem nesta união uma oportunidade para derrubar João Lourenço e restaurar o velho sistema — aquele em que o Estado era um negócio de família e a corrupção era regra, não exceção.
A esta frente junta-se um grupo de activistas avençados, muitos dos quais outrora críticos ferozes do regime, mas que hoje alinham com os interesses do clã dos Santos. Movidos por ressentimentos, financiamentos obscuros ou simples ambição, tornaram-se peças úteis numa narrativa que tenta pintar Lourenço como o vilão e o passado como um tempo de estabilidade e prosperidade.
Mas essa “estabilidade” é uma ilusão perigosa. O que o Neo-Santismo tenta vender como um tempo de ouro foi, na verdade, um período de desigualdade extrema, repressão política e saque institucionalizado. A riqueza de poucos foi construída sobre a miséria de muitos. E agora, com discursos sedutores e alianças improváveis, querem fazer o país esquecer isso.
Mais preocupante ainda é a forma como esta corrente está a infiltrar-se nas estruturas do Estado. Usando os velhos métodos de sempre — laços familiares, compadrios empresariais e redes mafiosas — o Neo-Santismo está a tentar capturar novamente o aparelho estatal. O objectivo é claro: restaurar o “governo privado” que transformou Angola num feudo de interesses particulares.
João Lourenço representa uma tentativa de ruptura com esse passado. A sua luta contra a corrupção e a moralização do Estado enfrentam agora uma contra-ofensiva feroz. O Neo-Santismo quer não apenas desacreditar o seu governo, mas derrubá-lo — e, com isso, apagar os avanços feitos em direcção à transparência e à responsabilização.
A sociedade civil precisa de estar atenta. O maior perigo para a democracia angolana pode não vir de um golpe qualquer ou duma eventual agitação, mas sim de um regresso disfarçado — com rostos conhecidos, discursos reciclados e promessas enganadoras. O Neo-Santismo não é apenas uma corrente nostálgica. É um projecto de restauração oligárquica. E cabe-nos a todos impedir que Angola volte a ser refém de um passado que nunca foi tão dourado quanto agora querem fazer crer.