Banco de Isabel dos Santos financia a UNITA. BNA e UIF a “dormir”

ByTribuna

3 de Janeiro, 2022

No dia 21 de Dezembro de 2021 foi carregada a conta n.º 162586481.0001 do BIC pertencente a Simão Albino António Dembo com o montante de 250 milhões de Kwanzas (cerca de meio milhão de dólares).

Este montante foi creditado na forma de descoberto bancário.

Como se sabe um descoberto bancário apenas acontece em relação a pessoas que gozem de privilégios junto da administração do banco e servem para operações de curto-prazo, como necessidades urgentes de tesouraria.

OS DONOS DA CONTA QUE RECEBEU MEIO MILHÃO DE DÓLARES

A estranheza desta operação começa no facto de se referir a uma conta conjunta em nome de três pessoas:

– Adalberto da Costa Júnior.

– Simão Albino António Dembo.

– Álvaro Chikwamanga Daniel.

Quem percebe um pouco de banca, sabe imediatamente que temos aqui uma situação anómala, ou usando linguagem corrente, “uma vigarice” ou “gato escondido com rabo de fora”.

O surgimento do nome de Simão Albino António Dembo como primeiro titular apenas serve para disfarçar, pois todos os titulares têm poderes iguais e simultâneo acesso à conta.  Dembo é deputado da UNITA à Assembleia Nacional.  Álvaro Chikwamanga Daniel é secretário-geral da UNITA.

Facilmente, se entende o óbvio. Esta é uma conta da UNITA, titulada por alguns dos seus principais dirigentes que assim contornam a lei do financiamento dos partidos políticos e a lei dos partidos políticos. Ao financiar directamente pessoas singulares e não o partido, está-se a realizar uma fraude à lei, colocando de fora a aplicação das normas imperativas da lei do financiamento e a abrir a porta a um total descontrolo e possivelmente ao desvio e branqueamento de capitais

Mas ainda mais grave é o papel do BIC neste financiamento ilegal. Um descoberto dá-se a uma empresa ou pessoa singular com muito movimento que nalguma altura precisa de um montante, que cobrirá passados poucos dias ou semanas em virtude do seu normal movimento financeiro.

Como estes três não andam no negócio das bananas e não estão à espera de receber fundos da venda desse fruto, não se vê como vão “tapar” o descoberto. Não vão.

Esta foi uma forma encapotada de financiar a UNITA, fugindo à maior parte da burocracia.

ISABEL DOS SANTOS A FINANCIAR ADALBERTO E A UNITA

O problema é que à medida que se investiga, o penoso da situação vem ao de cima de forma espectacularmente óbvia.

O BIC pertence a Isabel dos Santos e Fernando Teles. E, embora as participações de Isabel tenham sido “congeladas”, esta continua a mandar no banco e a administração é a mesma nomeada por ela. Uma consulta aos membros da equipa de gestão confirma perfeitamente que está tudo na mesma. São os fiéis de Isabel e de Teles que lã estão. E como banqueiros experientes sabem que a forma mais fácil e discreta de financiar a UNITA é autorizar um descoberto a uma conta conjunta de três cidadãos privados.

UIF E BNA “A DORMIR”. A NECESSIDADE DE INVESTIGAÇÃO DO SIC E DA PGR

Contudo, se o banco de Isabel se comporta assim, a Unidade de Informação Financeira (UIF) e o Banco Nacional de Angola (BNA) não deviam deixar passar estes factos.

O montante envolvido, o facto de ser um descoberto e de os beneficiários serem políticos, são três factos que deveriam ter alertado os mecanismos de controlo quer da UIF, quer do BNA. Não tendo tal acontecido ou andam “a dormir” como se tem visto em inúmeras situações do passado ou estão coniventes com estas ilegalidades.

O que é certo é que além do BIC que deverá ser fortemente sancionado por estes modos de financiamento partidário ilegal, a UIF e o BNA terão de levar “um puxão de orelhas”. Ou fazem o trabalho deles, ou os seus responsáveis têm de ser urgentemente substituídos.

Para que isso aconteça e não se verifique uma situação de alarde sem consequências legais, é fundamental que o SIC e a PGR procedam às devidas investigações criminais no sentido de perceber qual a razão para o silêncio ensurdecedor da UIF e do BNA. Existe mera negligência ou há um comportamento doloso, isto é, com vontade expressa, de ignorar os financiamentos ilegais do BIC à UNITA? Se houver dolo na conduta dos agentes públicos responsáveis pela UIF e BNA, estes devem ser acusados nos termos das novas leis de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo.

INVESTIGAR O BIC É UMA OBRIGAÇÃO

Por sua vez, as mesmas instâncias devem investigar directamente o BIC. É a segunda vez em pouco tempo que este aparece envolvido em situações estranhas e potencialmente criminosas. A primeira foi com Pedro Lussaty, principal investigado da operação Caranguejo. É que foi através do BIC que este indivíduo se apoderou duma fortuna. Nenhum controlo interno, nem do BIC, nem dos supervisores funcionou. Como se costuma dizer: “na primeira, caiem todos, na segunda só cai quem quer…”. É extremamente suspeito aparecer sempre o BIC nestas activdades ilícitas.

O PERIGO DE EXTINÇÃO DA UNITA PELO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E A INTERVENÇÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS

O artigo 33.º da Lei dos Partidos Políticos não oferece dúvidas ao determinar que o Tribunal Constitucional extinguirá um partido político quando este receber, directa ou indirectamente, financiamentos proibidos nos termos da lei (alínea e) do n.º 4 do artigo 33.º da Lei dos Partidos Políticos. Consequentemente, o SIC e a PGR têm de averiguar todo este procedimento de movimentação de dinheiros, e se for concluído da existência de ilegalidade nos financiamentos e possível branqueamento de capital, deve ser aberto processo de extinção da UNITA no Tribunal Constitucional.

Alternativamente, é muito provável que também seja necessária a intervenção do Tribunal de Contas, para nos termos da mesma Lei dos Partidos Políticos apreciar algum conflito interno sobre a utilização de fundos (art.º 29.º n. º2) que certamente, algum militante consciencioso e temeroso pelo futuro da UNITA não deixará de levantar.

Face a este financiamento ilegal é tempo das instituições: SIC, PGR e Tribunais funcionarem.